Tuesday, December 22, 2009

[aqui está o vazio]

Hoje esta cadeira não gira. Não mexe. Como não respira nenhum poro em mim, pelo menos não de forma que o sinta. O meu corpo descobriu que na ausência da metade não é um corpo, mas um físico inacabado que dói. O meu colo está vazio quando quem lhe pertence lhe falta por razões que desconhece. A minha cabeça prende-se num único pensamento de nome próprio que a cada segundo se segreda entre os meus lábios. E às vezes parece que não sei pronunciar qualquer outra palavra, que também não o quero porque sem esse ser que a preenche nada tem sentido e o sentido de tudo cabe nestas sete letras que se cravam em cada um dos meus sentidos. Hoje o meu coração sabe que existe, como nunca antes o soubera; sabe quando bate acelerado na ansiedade da espera ou quando desacelera em ritmo parado no seu prolongamento. Hoje eu sei que existo, porque existo para alguém que em tudo existe para mim - do bilhete pré-comprado de autocarro hoje para outro destino que não Santos ao sabor da rúcula de um qualquer outro Valentino ou às velas que acesas «desescurecem» spots num espaço não magnético onde essa luz ainda não foi por nós partilhada e se apaga lentamente, na verdade, nos meus olhos sós. E eu acordo assim; eu adormeço assim; eu passo cada dia assim.
Há uns anos, quando a minha vida verdadeiramente começou, as ausências não eram ausentes. Ganhava vida nesses instantes, por mais fugidios que fossem. O sobe e desce da Avenida não mais não teve sentido nem destino.
Hoje não sinto vida em nada mais. Eu entro na vida das pessoas, dizem, e na minha esta foi a entrada triunfante. Fez-me. Eu deixei de ser quem sou para ser-me. E talvez não mais seja o verbo catarinar que a L encontrou em mim ou talvez o seja mais agora que em qualquer outro outrora antes.
Há quem diga que tenho um dom. Outros chamam-lhe magia. Outros tornam-me um verbo (e hoje eu tão pouco me sinto acção...). Sim, eu tenho um dom. Hoje sei-o e sei-o de cor, em todas as cores, em todos os sentidos. Amar. E Amá-lo é ser-me na minha força e na minha fraqueza, na minha capacidade e na minha impotência, no meu desejo de o ver feliz e de não senti-lo sorrindo.
E pela primeira vez quando na frente do meu público respondi por Sophia ao Reis pessoano senti cada palavra nos excessos de Campos de Pessoa...
"Não creias... que nenhum estio
Por nós perdido possa regressar
Oferecendo a flor
Que adiamos colher
Cada dia te é dado uma só vez
E no redondo círculo da noite
Não existe piedade
para aquele que hesita.
Mais tarde será tarde e já é tarde.
O tempo apaga tudo menos esse
Longo indelével rasto
Que o não-vivido deixa.
Não creias na demora em que te medes.
Jamais se detém Kronos cujo passo
Vai sempre mais à frente
Do que o teu próprio passo."
... E febrilmente as palavras me invadiram, me roubaram as forças, me encostaram, me sentaram. Do fundo de mim gritou-se que em todo o tempo que esperei sem saber antes de ser-me cabe todo este tempo em que tenho ainda a esperar-te. E eu espero. Só este blog é que termina aqui.

























Thursday, December 17, 2009

Não achem estranho...

Agradeço os convites, as assistências e insistências, esse refilar interminável e até as caras meio feias que fazem quando fico quando tudo o resto acontece.
Mas saibam então que o Natal será como em todos os anos até agora - na excepção do único em casa de amigos - numa mesa pouco cheia de gente mas cheia do melhor. E a passagem para o novo ano? Será sossegada no meu novo cantinho. Mas estou-vos agradecida: a viagem ter-me-ia parecido excelente, mas num outro tempo, numa outra altura; a festa ter-me-ia soado bem, mas não estes dias; e tudo o resto é simpatia vossa, mas igualmente falta de vontade minha.
Não levem a mal, não se zanguem, não fiquem furiosos ou decepcionados. E não achem estranho... Talvez um dia, num outro tempo, em outros dias que não nestes que vou vivendo.
PS - Não se esqueçam que este ano não devem comprar o que quer que seja para mim; gastem esse valor com o que vos faça felizes ou façam bem a alguém.

Monday, December 14, 2009

Last night I cried myself to sleep...

...My life would suck without you.

Saturday, December 12, 2009

A festa do pequeno A

Estou sentada na cadeira de posição lótus a ver a noite a cair e a piscar os olhos ao relógio. A esta hora deveria estar sentada numa primeira fila a ver o pequeno A a mostrar o ar da sua graça na dança que lhe ensinam há semanas na escolinha. Deveria dentro de segundos me levantar aplaudindo entusiasticamente para que visse o meu melhor sorriso no meu rosto, para que também ele sorrisse naquelas covinhas-de-menino-traquina adoráveis que faz e, depois, os dois estivessemos a dançar juntos por mais um bocadinho em mimos no final da festa de Natal como na minha sala quando sozinhos. Pergunto-me o que pensará quando olhar para a plateia. Nesse instante creio que o pequeno A não verá ninguém da sua gente. Temo-o. E eu, silenciosa e secretamente, desejo apenas que os seus quase-três-anos o impeçam de compreender que nenhum desses seus pronomes possessivos ali não está e que não lhe permita a inconsciência natural nas crianças de se questionar porquê.
A esta distância, aqui sentada, consigo imaginá-lo meio envergonhado, como quando se esconde atrás das minhas pernas ao falarem-lhe e no mesmo segundo imagino-o amanhã palrando atrás de mim pela casa a contar tudo e mais alguma coisa enquanto estamos verdadeiramente juntos.
Agora... Queria mesmo lá estar. Medi todas as possibilidades e mais algumas. É-me impossível. Agora...

Autch!!!!

Acabei de lascar uma unha pela primeira vez... E - que fique bem claro - não apreciei em nada a experiência.

Wednesday, December 09, 2009

So what?

Contento-me com o que para muitos será pouco e emociono-me do mesmo modo. Sempre fui assim e quem por ventura pensasse que mudaria um dia, começará agora a aperceber-se que se terá enganado. Todos crêem que sou dura como uma pedra que nem lasca ao cair...
Mas tenho os mesmos amigos há anos - os mesmos pobres, os mesmos ricos, os mesmos em contas bancárias e morais. Emociono-me com tamanhas simplicidades como com os cânticos da missa dominical a que assisto. Deliro quando alguém que conheço consegue ultrapassar uma dificuldade ou superar-se. Assusto-me quando sou eu quem consegue contornar o incontornável, porque sinto sempre que me desconheço. Choro ao lembrar-me de quem gosto e não tenho [fisicamente] ao meu lado. Se isto é ser sentimental, então, sim, sou uma sentimental. E depois?

Monday, December 07, 2009

A lista do Natal...

O correio terá um serviço em paralelo. Os meus pequenos fizeram chegar-me às mãos duas cartas para o Menino Jesus e para o Pai Natal. Não tinha conhecimento de que tais serviços estivessem assegurados e não posso dizer que a lista dos pequenos é enorme, mas posso adjectivá-la como apreciável. Pedem de tudo um pouco e argumentam a cada linha terem sido bem comportados ao longo do ano. Ainda não consegui perceber até que ponto eles entendem o que dizem... Mas, como ouvi um senhor padre dizer em tempos idos, também eu acredito que as crianças não têm pecados; pagam apenas muitas vezes parte do preço dos pecados dos adultos de quem estão dependentes.
Este ano foi-me diferente em tudo. Se me pedissem para resumi-lo, não saberia como, mas saberia a quê. Há momentos que nos marcam e este ano foi também ele rico nesse aspecto. Por isso me sinto mais pobre hoje e tento a todo o custo entender o serviço paralelo dos correios nacionais para fazer o meu pedido na minha folha de recado. Faço-o de coração. E argumento como os pequenos que também eu me portei bem todo o ano.


Saturday, December 05, 2009

Busca-se

Há semanas que não vinha a este lugar... [A casa onde cresci e fui renascendo está igual ao dia em que dela me fui embora de novo certa que um dia a ela voltaria, como hoje se comprova já que aqui estou. A minha cama pareceu-me maior, mas dedicada na mesma suavidade dos dias em que regularmente me deitava nela. A cidade lá fora vive da mesma maneira, com o mesmo verde dos jardins de beira-rio, um regato que atravessa a cidade na falta de chuva, as iluminações de Natal e até a Árvore a que não mais sei chamar se não de sonhos. O frio gela os cantos da cidade e os aquecimentos resguardam os corpos interiores do gelo que se esgueira pelas janelas. Tudo me parece igual. Acho que só eu mudei. Algumas partes do meu corpo desapareceram, estão escondidas, absorvidas ou adormecidas no peso que perdi e só agora tristemente dei conta - como quem perde as chaves ao pequeno-almoço e só no regresso a casa ao fim do dia dá pela falta por não ter como se recolher ao lar.] E isso preocupa-me...

Tuesday, December 01, 2009

Adventus


Adormeci novamente na companhia do computador, do stress dos cinco minutos a que fiquei da meia-noite e do susto de me equecer que em Madrid é sempre mais uma hora que em Lisboa. Adormeci novamente acompanhada pelo telemóvel. Mas adormeci.
Acordei maravilhada neste primeiro dia do Advento. Tenho as palavras do senhor padre na minha cabeça e o coração quente que se transborda em Amor. Este ano é um ano especial, como todos os dias devem ser. Tenho as velas acesas como o sangue que me corre nas veias e o Presépio feliz espelhando-se no meu sorriso, fruto nesse instante da graça do Menino Jesus aconchegado no calor do corpo de Maria e na atenção amorosa desdobrada no abraço demorado de S. José.
Amanhã espero acordar do mesmo modo, envolta em esperança - essa que me recuso a deixar escorrer-se de mim. Que celebremos todos na Luz desta Quadra a vinda do Salvador, independentemente de crenças ou descrenças, de forças ou fraquezas, de sonhos vividos ou apenas sonhados.

Sunday, November 29, 2009

O osso na pele não é o que mais dói

Quando olho para trás não vejo dias; vejo pensamentos e sentimentos. Mal sei sequenciar tudo quanto tenho feito e, por muito que tenha sido, mal me lembro. Não me lembro até de me lembrar. A contagem do dia não é feita pelos dedos, mas pelas batidas cardíacas que se esbatem no fluxo sanguíneo pelo meu corpo num eco vazio [e sonoramente esvaziado]. De sexta - o máximo que alcanço - lembro-me de me ter esquecido de comprar o jornal; dei conta quando me faltou o livro de companhia na cama. De ontem lembro-me de me ter esquecido de comprar alho; reinventei a receita o melhor que me foi possível e a criatividade (re)criou(-se) até no sabor que as minhas papilas aguentaram. De hoje lembro-me de me ter esquecido de abrir a garrafa de vinho ao almoço para o meu pai; apercebi-me quando fui encontrá-lo em busca de um saca-rolhas no meio dos mil e um apetrechos da minha cozinha. Mas amanhã, com toda a certeza, não me lembrarei de esquecer o olhar triste e preocupado dos meus pais; esse fixou-se em mim como se parte da pouca pele que novamente tenho a cobrir os ossos. Perdi peso de novo... e a roupa perde-se em mim de larguezas. Começo a desesperar sem saber o que fazer. O meu corpo não me responde; não mais me respeita. Hoje, quando meio-mundo-menos-uma quer perder peso, eu só (re)penso maneiras de ganhá-lo.

Saturday, November 28, 2009

Mãos

Entram em mais um dia sapateando no teclado. As minhas. Estas que falam comigo. Estas que me afirmam e me desmentem na rapidez dos pulsos que correm. Antes se embrulhassem na sua suavidade mimando um rosto. Antes aquecessem em festas um peito de encosto. Antes afagassem o cabelo que delas se liberta fugidio. Antes massajassem todo o território de umas costas que acreditam conhecer. Antes se deixassem descansar entrelaçadas nos dedos das outras mãos que seguram mesmo quando nada há a apertar por entre dedos, nada mais que o vazio por onde o tempo escorre. Estas mãos. As minhas. Estas que me confessam na rapidez dos pulsos que correm.

Friday, November 27, 2009

Wednesday, November 25, 2009

Morango ainda sem champagne

Esta manhã sentei-me na sugestão de Caeiro junto a uma janela predilecta, não com a sua Arte na mão escorrendo como um rio perante os meus olhos, mas com um iogurte de puro aroma de morango. É o mais perto que consigo do champagne com morangos que poderia ter desfrutado na celebração de mais um passo em frente. Opção, acreditem. E os meus amigos que se perguntam desde já porque não lhes enviei mensagem a contar do suposto grande feito não se inquietem - sabe quem tem de saber porque foi um "suposto grande" feito a dois. Vocês, meus amigos, que me conhecem, sabem que as minhas pernas nem sempre se movem no à vontade desejado mesmo que a vontade me seja superior às forças; sabem como me tremem os ossos, como de alguma forma subtil vou brincando com o lábio em jeito de entreter a emoção e para me envolver em razão e deixar tudo fluir naturalmente. Parece contraditório, eu sei. Mas é apenas a minha maneira de dar um chega-para-lá ao medo, à insegurança, ao que sou. Se fosse eu Pessoa, diria que esta é a minha maneira de me outrar. Vocês, meus amigos, sabem que cada passo que dou agora não dou sozinha, porque eu nunca estou sozinha. E sabem-no porque acredito que o sentem. Só assim consigo avançar - a dois; e avanço determinada nessa força. Por isso, ontem, quando a noite segredou o reboliço da cidade e o quietou nas suas luzes celebrei na única maneira possível de celebrar - com aquele que está sempre comigo, porque parte de mim e eterno sócio do meu coração. E sorri.
Então, esta manhã sentei-me na sugestão de Caeiro junto a uma janela predilecta saboreando o puro aroma dos morangos que guardara dias antes no frigorífico. E fiquei sossegada a ver as gotas desfeitas pelo chão que haviam molhado o exterior, quebrada pelo frio que me penetrava pelos poros e com a vontade infinita de me enfiar de novo sob o edredon e deixar-me adormecer para mais um dia; mais um daqueles dias que espero que vão passando até ao dia que espero por chegar.

Tuesday, November 24, 2009

Desafio: a sexualidade da rainha em 20.000 palavras?

Culinária e sexualidade. Preenchem-me horas nestes últimos dias. São mais do que conceitos por cada canto da casa, pela zona onde trabalho e a zona onde descanso e aquela que fica no intervalo do indeterminado. Respiro inspirando e expirando, vivo e pareço alimentar-me de culinária e sexualidade estes dias e sem moderação num aperto temporal que se esbanja na passagem dos minutos corridos.
Eça, diz-se e di-lo ele mesmo, reduzia ironicamente as mulheres a estas duas Artes, estas mesmas que para muitos não têm qualquer semelhança e que para outros são sinónimos de prazer. E eu que ando entre a culinária e a sexualidade estes dias pergunto-me se não serão um tanto ou quanto a mesma coisa: a entrega total, a atenção, o cuidado, o agrado, a partilha, a expressão acesa do que nos vai no coração e na alma, o desejo...
Sempre ouvi dizer que nestas Artes a entrega deve ser a mesma. Ou não?

Sunday, November 22, 2009

What I'd give...

- Sugarland

'My best friend' - Tim McGraw

Depois de ver o 2012 e de chorar estupidamente em partes do dito só desejo que...

...oxalá, Coração, tenhamos nós muito tempo juntos.

Nesta hora em que busco o caminho para a cama...

Se alguém souber onde me ficaram as mãos, aquelas que desliza(ra)m em massagens de entrega física e espiritual, aquelas que não mais sinto em mim neste momento, por favor que me avise... Se alguém souber onde se me estendem as pernas agora, aquelas com que palmilho a cidade grande e reencontro a cidade pequena, aquelas que suportam todo o meu peso e por vezes me arrastam por entre o estar-se só na multidão, por favor que me avise... Se alguém souber de mim hoje, por favor que me avise. Os olhos pesam-me demasiado e nada mais sei nestes minutos.

Saturday, November 21, 2009

(Des)Encaixada no fim de semana


Eu tenho caixas, caixinhas, caixotes, envelopes, pacotes e pacotões. Chegam aos pares e em trio como gémeos (quase) não esperados. Mas ainda bem que chegam. Tenho os pequenos em testes, responsabilidades, livros por ler e para ler, revistas por espreitar e arrumar, catálogos por desaparecer e por marcar, páginas por escrever e enviar, cadeiras em fila indiana e o cabelo apanhado. Andar de cabelo apanhado há dias é em mim sinal de quem ainda não parou e só se lembra da cama pelo conforto que lhe dá.

Não tenho horas nem minutos nem segundos não ocupados. Não tenho tempo para tudo o que quero e para tudo o que preciso fazer ou mesmo para o que tenho de fazer. Mas faço o Tempo. À minha medida e a tempo...

Mesmo assim, às vezes, a vontade que dá é empacotar o tempo, descansar as pernas, desatar o cabelo sob água bem morna no chuveiro e esquecer que o tempo lá de fora hoje rega a capital e, pelo que me dizem, outros espaços e espacinhos do país.

Dickens e o Natal

Quem for ver o novo filme Disney em 3D com base no Conto de Natal de Charles Dickens sai da sala de cinema com toda uma nova perspectiva da realidade... e da importância de ver ou não ver bem e melhor.

Wednesday, November 18, 2009

Vou arriscar ver isto. É-me mesmo um risco.

De índios e cowboys e pessoas mais comuns

Uma comunicação a apresentar possivelmente dentro de meses no Canadá despertou-me. Não são muitas as alturas em que recordo aquele país, aquelas gentes tão diferentes, aqueles aromas desiguais, os esquilos que correm e as pessoas que pelas ruas andam num mesmo andamento. Das imagens que mais tenho marcadas na memória é a da loja de decorações natalícias que está aberta durante todo o ano no centro de Montreal. Nem sempre penso nisso, mas sempre que vejo uma casa bem decorada para a Época lembro-me do cheiro a azevinho e quase sinto tilintar nas minhas orelhas os sinos que badalam suave e alegremente quando se entra naquele espaço quase celestial. Não tenho cidade preferida, mas Montreal de alguma forma me diz mais que as outras daquele território. Talvez pelo velho porto e os barcos que navegam pelo Saint Lawrence, a Notre Dame e a sua luz aveludada, os restaurantes da Place Jacques Cartier ou as lojas da rue Saint Paul, a comida grega ao lado do Bonanza ou até pelo Sam que a refilar lá ía atravessando com a limosine a cidade como eu lhe pedia a cada saída sem destino. Lembro-me também da universidade, da camisola que de lá trouxe e que ainda hoje visto e das conversas imperceptíveis dos estudantes nos corredores que se silenciavam no passo da entrada da biblioteca recheada de livros. E lembro bem a bandeira da província, da asteada às quatro estações por onde passava quando me ía deliciar à Dairy Queen e da que trouxe presa na mão quando embarquei no gigante da TAP.

Assim vejo-me grega!

Xoriátiki saláta



Três tomates grandes, duas cebolas roxas, dois pepinos e um pimento verde cortados em juliana. A juntar cerca de 15o gramas de queijo Feta, uns 100 gramas de azeitonas pretas e óregãos a gosto. Regar tudo com o tempero: vinagrete de azeite, sal, pimenta e um pouco de vinagre.

Se eu nunca fui à Grécia...


... como acordei a pensar em Kourabiédes?


Uma chávena de manteiga sem sal bem batida. A juntar gradualmente meia chávena de açúcar em pó, uma gema de ovo e uma colher de sopa de conhaque o brandy. Depois três chávenas de farinha simples e uma colher de chá de fermento em pó. Há então que amassar bem e ir misturando uma chávena de amêndoa picada. Quando bem amassado e misturado basta esticar a massa e cortar nas formas que desejamos. Restam vinte e cinco minutos de espera, o tempo em que a massa agora nas suas várias formas recortada vai ao forno a cerca de 125º num tabuleiro bem untado com manteiga. A melhor parte vem no fim: depois de polvilhadas ainda quentes em açúcar em pó, há que comer as bolachas! :o)

Não entendo.

Da marca do café que bebem à do chá. Da marca da máquina em que fazem o café à marca da chávena em que bebem o chá. Da quantidade de canais de TV ao número de lugares do sofá da sala. Do salário do outro que se julga mais alto ao que têm como seu e como mais baixo. Do carro que o outro conduz ao que querem conduzir. Do jardim da casa ao espaço do sótão. Do número de lugares de estacionamento às pessoas que nos saúdam na rua. Dos quilos que se têm a mais aos quilos que se têm a menos. Do penteado ao corte de cabelo. Das cores da roupa à marca que se julga terem por trás. Da vida que se vê fazer à vida que se julga que faz... Por que raio têm as pessoas a mania de competir por futilidades?

Playlist da madrugada III

'This kiss' - Faith Hill

Playlist da madrugada II

'To make you feel my love' - Garth Brooks

Playlist da madrugada I

'You had me from hello' - Kenny Chesney

Quando a noite caiu...

... mais um momento (fugidio) muito feliz.
A P falara-me em tempos do inesperado; como eu o espero agora! Sempre! A AR falara-me em tempos que a Felicidade não existe, mas apenas momentos felizes; como eu acredito nisso!

Tuesday, November 17, 2009

De Vidda

Numa caixa que embrulhava papéis e tiras e notas talvez perdidas encontrei Vidda. Sossegado nas folhas brancas onde o havia copiado da tela de computador. Com o mesmo jeito doce, elegante, carinhoso e sedutor. Nem sei há quantos anos me fez companhia nos minutos que levei a escrevê-lo. Não ligo a essas coisas. Não tomo nota dessas coisas. Não tomo notas sequer para reproduzir essas coisas. Como Vidda, que correu ao meu reencontro ontem, andam também uma Flor e uma Borboleta, uma Zabescaza e um sem número de outras gentes com que me fui encontrando na ponta dos dedos.
Mas ontem foi Vidda quem me fez companhia ao jantar e do alto da sua grandeza me lembrou, vaga e gradualmente, de que a sua existência tem sido mais demorada que as lembranças do D na pediatria do Instituto que nasceram depois; daquela capacidade que às vezes se desfaz em mim de crer que, quando queremos e acreditamos, muito pouco ou nada nos é impossível. Vidda lembrou-me também que o A Grande ficou de lhe dar corpo nos seus calções com suspensórios azuis e que eu sinto saudades deste teclar criador que - sem saber porquê - fui deixando de sapatear.
Talvez parta eu agora a esse reencontro.

O frio lembrou-me... também da farinheira


Li há tempos esta receita algures. Talvez no Cinco Quartos de Laranja. Hoje por caso lembrei-me dela e não deve tardar muito a que a faça. Não fosse a falta de tempo que me faz ficar pela sopa de castanhas hoje ao almoço e arregaçaria as mangas para petiscar este manjar. Picaria duas cebolas e dois dentes de alho para um tacho, mistura que ligaria com azeite para refogar a cebola e acrescentar cerca de meia a uma cenoura em cubinhos. Quebraria o lume para brando e adicionaria uns 300 gramas de arroz e cerca de um decilitro de vinho branco. Sempre mexendo para misturar ou envolver e não deixar que nada se agarre ao tacho. Entretanto escaldaria cerca de seis folhas da couve lombarda e corta-las-ia em tirinhas (tão bem quanto me é possível, pois a minha prática nestas coisas não é muita!!!) e retiraria a pele da farinheira para, ao colocar tudo dentro do tacho quando o arroz está quase cozido, estar tudo com a melhor das apresentações e o melhor sabor. Bastam uns minutos. Estando o arroz cozido, tudo está pronto a ser saboreado. Eis na vossa mesa Arroz de Farinheira e Couve!

Num S. Martinho mais atrasado...


... sopa de castanhas


É simples e delicioso. Basta cozer cerca de 100 gramas de feijão encarnado e 250 gramas de castanhas descascadas e bem limpas em água e sal qb até as castanhas ficarem bem macias. Depois, é temperar a gosto - geralmente recorro a um pouco de margarina (pouco mais que uma unha de polegar) porque ajuda a aveludar o preparado, uma pitadinha de pimenta branca para dar mais sabor, meia ou uma cebola bem picadinha e um pouco de chouriço e de presunto cortados em pedacinhos. Nada de abusos. É deixar cozer e ir mexendo durante cerca de trinta minutos e rectificar a quantidade de água e o tempero. Depois há que adicionar massa fininha e um pouco de azeite e deixar cozer mais dez minutos. Mexe-se uma vez por outra. É um preparado a comer, com ou sem pão torrado, triturado ou não, bem quente. Delicioso!

Monday, November 16, 2009

Acordei esta manhã...

...para um novo dia. O primeiro de toda uma nova vida.

Saturday, November 14, 2009

Friday, November 13, 2009

Há minutos num dia que valem por todas as suas 24 horas.

Este é o texto do saber do Bernardo

Falo-lhes tanto de Pessoa. Falo-lhes de pessoas na realidade. Lembro-os que o são. Por vezes parecem(-me) tão esquecidos... E depois, por vezes, recebem-me em palavras que me surpreendem, que se tornam tão inesperadas quanto o sol que me bate nos olhos e não chega sequer a perturbar no calor de um mimo a quem nos quer e queremos bem (é nesses momentos que vemos tão melhor!!).
Do alto dos seus vinte anos tenho poemas do I para a miúda que ama, daqueles que escreve com alma e coração e me pede que corrija para não passar vergonha; outros não teriam vergonha das palavras mal escritas, mas do poema que as coisas do coração lhe escrevem. Do alto dos seus quase vinte anos tenho do J a sabedoria de uma adolescência requintada de descobertas e de certezas que só os adultos se atrevem a questionar - eu não devo sê-lo na verdade porque não o questiono; limito-me a ouvir. Do alto dos seus menos de vinte anos escreve o B para que eu corrija sobre o Sol, o Sonho e a Razão... E eu corrijo apenas a ortografia por nada mais haver talvez a corrigir. Como disse Pessoa, "Sentir? Sinta quem lê!". Como eu o sinto! Ai, como eu o sinto!
"Todas as pessoas têm hipóteses. Hipótese de dizer mamã ou papá quando aprendem a falar. Têm a hipótese de escolher o amigo x para a equipa do que quer que seja. Têm a hipótese de escolher o curso para que vão ou mesmo o carro que desejam comprar.
Mas será que toda a gente possui a hipótese de ter Amor na sua vida? Aquele amor que nos liga aos outros, aos bens pessoais ou mesmo a nós próprios? Há quem não acredite em Amor (...). Mas será que é mesmo assim ou somos nós que simplesmente não lhe damos uma hipótese? Somos nós que não damos a hipótese a certa pessoa do beijo que ela merece e que nós tanto anseamos dar. Somos nós que inventamos demasiadas complicações para evitarmos estar com as pessoas de quem gostamos e que gostam de nós. Somos nós que guardamos demasiada preguiça para tentar alcançar os sonhos que temos ou algo que queiramos. Somos assim... Somos assim porque temos medo. Medo de sofrer, de amar e não ser correspondido, de querer beijar e não ser beijado ou mesmo de tentar alcançar algo e não conseguir. Medo de uma sociedade fria e escura que nos contagia até aos ossos.
Porque não existe um sol? Todas as pessoas merecem o seu sol. (...) Claro que, muitas vezes, existem dificuldades ou mesmo precalços, mas a vida é mesmo assim. (...) Apenas quando lutamos e desejamos realmente algo ou alguém é que esse algo ou alguém se torna realmente nosso e ficará connosco para sempre.Por isso chega de conversa, acabem de ler e vão procurar o vosso sol. Dêem-lhe uma hipótese. Porque eu já encontrei o meu."

Leva-me aos fados

Tenho encontro marcado com Ana Moura sábado. O sossego da noite, o trinar das guitarras no embalo das violas. Ela levar-me-á pela mão como criança pequena que descobre novos mundos no mundo. Far-me-á emocionar em lágrimas com o fado que me lembra alguém, com o fado que me lembra o que vivi com alguém, com o fado que me lembra o que não vivi com alguém, com o fado que me faz crer poder ir vivendo. Ana Moura levar-me-á aos fados, caminhando isenta de passagem na sua voz, embrulhada nos versos dos poemas de outros cuja poesia poderia tantas vezes ser minha. Está marcado para sábado. E eu estou já no cais de embarque para essa viagem.

Tuesday, November 10, 2009

Eu teria ficado gaga...

Porque também aquece em dias frios

Enzo Bianchi, lembrou-me Laurinda Alves, afirma que tudo o que sabe sobre a vida e o amor aprendeu com o fogo. Acrescenta Laurinda Alves nesse texto que me passou pelos olhos que "um fogo que arde nunca deixa ninguém indiferente". Concordo. Suscita as mais variadas reproduções, realidades, sentimentos, atitudes... e nem sempre é destrutivamente sinónimo de arder. Não tem de sê-lo. Há que acreditar nisso.

Também eu ando nessa rua

O Montepio Geral apoiou, elas cantaram e encantaram e (o) Tordo não ficou torto de as ouvir. Quando o país se lembra dos seus poetas é sempre de aplaudir de pé. Ary dos Santos e a sua obra poética foram homenageados, celebrados, lembrados e versados nas vozes de Luanda Cozetti, Mafalda Arnauth, Susana Félix e Viviane. O projecto Rua da Saudade é um projecto a não perder.

Lembrança à minha cabeça

A lixívia queima. Queima as mãos, os dedos, a pele. Arde, dói e sangra. Sangra mesmo muito. Enquanto não souberem as minhas mãos fazer o que quer que seja de luvas, então que nada façam que peça luvas para sua defesa gritantemente.

Senhor Camões, como eu o entendo!

"Doces lembranças da passada glória,
que me tirou Fortuna roubadora,
deixai-me repousar em paz uma hora,
que comigo ganhais pouca vitória (...)."

Saturday, November 07, 2009

In class...






Ela: Ok, guys, what else can you tell me about this?



Eles: Droughts! Floods! Hurricanes! Ozone layer depletion!



Ela: Come on, class, what else?



Eles: hmm... hmm...



Ela: What else?



Ele: Nespresso time?



Wednesday, November 04, 2009

My coat of many colo(u)rs...

Há alturas em que "quero a minha mãe"... Esta é uma delas.

Saturday, October 31, 2009

Inesperado fim de dia...

A fábula do porco-espinho

Durante a era glacial, muitos animais morriam por causa do frio. Os porcos-espinhos, percebendo a situação, resolveram juntar-se em grupos, porque assim se agasalhavam e se protegiam mutuamente. Mas os espinhos de cada um feriam os companheiros mais próximos, justamente os que ofereciam mais calor. Por isso, decidiram afastar-se uns dos outros e voltaram a morrer congelados. Então precisavam de fazer uma escolha: ou desapareceriam da Terra ou aceitavam os espinhos dos companheiros. Com sabedoria, decidiram voltar a ficar juntos... Aprenderam assim a conviver com as pequenas feridas que a relação com uma pessoa muito próxima podia causar, já que o mais importante era o calor um do outro... E assim sobreviveram.
Moral da História: o melhor de um relacionamento não é o que une pessoas perfeitas, mas aquele em que cada um aprende a conviver com os seus defeitos e os defeitos do outro e a admirar as suas qualidades.

Wednesday, October 28, 2009

Ontem...

Foi um dia bom. Muito. E só à conta de uns minutos matutinos.

Sunday, October 25, 2009

Também eu...

“Tenho saudades de deitar a cabeça no colo da minha avó só para ela me fazer festas no cabelo. Muitas vezes sinto que ainda preciso dela para isso”. - António Lobo Antunes em entrevista a Judite de Sousa

As paredes que me confessam

O meu pediatra, o Dr. A - que é daqueles que desejamos para os nosso filhos e sobrinhos e pequenitos de quem muito gostamos, está igual: a mesma atenção, o mesmo ar despistado quase à Professor Pardal, o mesmo sorriso, a mesma voz, a mesma calma, a mesma atenção às mães nervosas e aos pais inquietos, o mesmo homem de mãos ternas. Mesmo depois de tantos anos passados. Mas o consultório do meu pediatra está bem diferente. Diferente lugar, diferente tinta nas paredes, diferentes tons... e toda a família Pan a navegar pelas paredes. Sininho, Wendy, Michael, Peter. E o menino Peter Pan que me faz questionar a simbologia na minha visita de ontem.

Saturday, October 24, 2009

Nada como um sábado de manhã...

... com uma consulta no pediatra. Só para reviver tempos idos.
A primeira coisa que me perguntou? A idade!!!

Friday, October 23, 2009

E se se deixassem ouvir uma vez por outra?

"O bom do escudeiro ajuda a velhinha a atravessar a estrada, embora não seja nada evidente que a velhinha quisesse atravessar a estrada. Mas uma boa acção nunca pede licença."
- Pedro Mexia em Ler Outubro 2009

Wednesday, October 21, 2009

O dia acordou choroso

Tapei o espelho do espaço. Demasiado espaço de reflexo para o que não se quer ver. Há coisas que não vale a pena sequer espreitar. Pelo menos não hoje. O vazio afinal também se espelha e vê-lo ali é tomar consciência de que é. No chão, a alcatifá-lo, as roupas de ontem, as compras desta manhã, papéis importantes em qualquer coisa e a minha sombra enegrecida pelo dia. Mais roupas. Mais calçado. Mais papéis. Mais sombras. Tudo isso é chão. E eu sou tudo isso. Em toda essa bagunça.

Sunday, October 18, 2009

Thursday, October 15, 2009

Wednesday, October 14, 2009

Susto

Há coisas que me inquietam o coração. O medo é uma delas. É um desconforto contínuo e perpétuo, um acordar sem chegar a adormecer, um pesadelo que se carrega sem escolha, um sofrer antecipado num presente que se galga ao futuro.

Tuesday, October 13, 2009

Objectivas

A minha paixão pela fotografia ressuscitou num daqueles dias em que o sol me estala na cara ao acordar quase em sobressalto. É o primeiro flash do dia num dia que não necessita de flashes. É um dia como tantos outros, seja lá o que isso quer dizer. É ter mil e um olhos bem observadores quando os meus dois desejam por instantes fechar-se. Mas estaria agora capaz de nesse embalo passar horas a fotografar os peixes que se perdem nas voltas limitadas a uma mesmo aquário, o livro mais recentemente lido no meu novo chão, as pessoas que desconheço e que me são vultos sem identidade, as saudades que sinto e no meu corpo se materializam, cada pormenor desse sorriso que conheço tão bem. Tenho a câmara ligada e os olhos velados pelo instante em que se dispara. Hoje fotografaria até aqueles a quem chamam vândalos, esses mesmos com quem eu me sento à mesa umas quantas vezes por semana e com quem ganho algum tempo... e, por vezes, dores de cabeça.

Monday, October 12, 2009

Do calor

Ai, aqueles minutos esta manhã... Aqueles minutos... Obrigada.

Sunday, October 11, 2009

À lei do chumbo pelas pernas

Avisa-se a quem idiota de direito e dever que em nada agradam as armadilhas espalhadas pela fazenda da senhora minha avó, apresentando-se desde já desagrado com justificação própria e pessoal:
1. Trata-se de propriedade privada: lá que andem a caçar passarinhos e coelhinhos na fazenda dos outros ainda se fecham os olhos - mesmo se só por dificuldades em controlar a situação, mas javalis já é demasiado;
2. As armadilhas nunca são boa ideia, principalmente quando uma jovem-mulher-também-da-cidade se lembra de, antes de regressar à capital, apanhar umas quantas azeitonas de mesa para retalhar e não deseja absolutamente (e sublinhe-se a palavra "absolutamente") perder uma das pernas. Afinal, não só a fazenda é da senhora minha avó como as pernas são minhas.
Por nada mais haver a acrescentar fica o aviso ao caçador, idiota de direito e de dever, que eu também dou chumbos. Sempre que necessário e/ou obrigatório enquanto resultado da acção ou não acção de outro.

Saturday, October 10, 2009

Blues

Ontem passaste na névoa de um casaco branco que vestias, no levantar da minha cabeça que prendera pelo enjoo da minha própria tristeza baixa sobre o colo, nesta minha incerteza de que tudo terá sido verdadeiramente real. Mas o meu coração bateu mais forte. Bateu-me no peito. Bateu-me nas pernas. Bateu-me nas mãos. Bateu-me nos dentes. Todo o meu corpo cansado em vida respondeu a ti.
Passaste na névoa do teu casaco branco naquela tarde que me parecia infindável e desejei que aqueles segundos em que te olhei fossem mais infindáveis que qualquer tarde assim. Os ponteiros do meu relógio retardaram como os da minha vida desde um dia. Atrasados. Como eu para um dia que se sonha até mesmo sem olhos fechados. E nessa noite, como em todas as outras, dormes a meu lado, no meu abraço, na batida que ainda sinto agora em cada uma das minhas veias, que batem no teu passo compassado e no compasso da música que se ensaia para o concerto desta noite. Também isso é vida. Como os blues, como o folk, como o country que esta noite, bem menos que tu quando ontem passaste na névoa de um casaco branco que vestias, me encherão o corpo sob os focos de luz. Também isso é vida.

Friday, October 09, 2009

Foi a 6 de Outubro

Uma destas tardes estive com ML. Ouvi-a. Atentamente. Senti-me como se lesse cada uma das suas palavras. São poucas as pessoas que se expressam assim, daquela maneira suave e determinada com que falava, decidida de conhecimento e sugestiva das maiores verdades. Senti-me como se tudo o que li por ela escrito até àquele momento nada mais fosse que palavras que ali, naquele filme ainda a negro e fragmentado de uma década qualquer mais antiga, ganhavam a vida da voz que as preenchia. Será essa uma das maiores verdades, talvez: há palavras que só ganham valor na voz que lhes dá vida; outras que de tão em surdina esperam a oportunidade de um dia aparecer.

Wednesday, October 07, 2009

Nada a declarar

Estes têm sido daqueles dias em que teria tanto a contar-te. Naquele entusiasmo que tão bem conheces e eu já não (re)conheço em mim. E esses dias agora passaram e nada mais há a contar.

Monday, October 05, 2009

No selim

As manhãs continuam a gritar-se estivais ou de uma primavera descoordenada porque adiantada no tempo. O D esta manhã pediu-me, do alto dos seus oito anos intensamente vividos, que me montasse na bicicleta e atravessasse todo o percurso com ele. Eu do baixo das minhas décadas senti necessidade de pensar se seria possível sem vergonha, mas no mesmo instante puxei do guiador, aperaltei o monta-cargas e descolei paralela ao D. Agora sinto toda a viagem alucinante por entre casas e fazendas em cada músculo do meu corpo, mas numa vontade estranha de voltar a repetir a dose enquanto as manhãs se gritarem. E o D, esse, está sempre pronto para pedaladas e jogos de bola e groselhas frescas e mimo - enfim, está sempre pronto para a vida.

Sunday, October 04, 2009

Sim, Agustina, longos dias têm cem anos

Agustina diz que longos dias têm cem anos. Os meus são hoje longos e sem anos. São daqueles que passam sem passar, sem sentirmos nada de nada porque sentimos de tudo. Tenho hoje dias de sol em que chove, momentos em que o voo das abelhas nas flores que me cobrem os cabelos me cegam de sons constantes aliterativos. Fazem zzzzzzz e zzzzzzz e esvaziam-me nesse enfadonho. Sinto que vivo assim cem anos nesses sem anos que ainda não vivi. É a publicidade que as abelhas fazem de mim mesma.

Saturday, October 03, 2009

Friday, October 02, 2009

Nhac!!!

Sim, tenham pena de mim. Muita. Estou a tomar diariamente e mais do que uma vez óleo de fígado de bacalhau. Ainda só não lhe descobri o noticiado sabor a banana...

Thursday, October 01, 2009

Apontamento

O A Pequeno estreou-se na escola dos mais pequeninos. Sem choro lá ficou vaidoso no seu bibe.

Wednesday, September 30, 2009

Carta fechada

Gosto do teu irmão. Porque gosto. Por não haver forma de não gostar.
Gosto de todas as coisas nele e dele em todas as coisas. Gosto de todos os sentidos e do seu sentir. Gosto do Verbo maior de quatro letras que nele faz sentido. Gosto porque gosto.
Gosto de todas as coisas pequenas: perfume, relógio, do jazz, dos Santos, do Avilez. Todas as pequenas coisas ganham a sua importância porque nele. Também por isso eu gosto.
Gosto principalmente das grandes coisas, das maiores, das melhores: do fim do dia na Avenida e de uma bola cheia de beijo, do molhado da relva do jardim num concerto a dois, dos haagen daz derretidos pelo esturricar do sol, das conversas inesperadas, do fresco dos degraus, dos ponteiros que (ainda hoje) marcam sempre a mesma hora, das manhãs que acordam solarengas e ofuscam uma conta que quase fica por pagar... Gosto, sim, do sorriso silencioso e do riso inesperadamente cantante, dos olhos que me espelham cuidadosamente, da voz que me fala e da atenção que me ouve. Gosto de tudo aquilo que a vida não lhe consegue roubar.
Gosto do teu irmão. Porque gosto. Gosto dessa parte de mim.

Tuesday, September 29, 2009

A (com)passo

Hoje o A Pequeno começou a subir escadas em um tempo apenas. Até esta manhã os dois tempos eram uma constante: primeiro um pé, depois o outro a seu lado; degrau seguinte e um pé e depois o outro a seu lado. Hoje o A Pequeno colocou um pé no primeiro degrau, sorriu-me naquele seu ar maroto de quem está prestes a atrever-se e no degrau seguinte colocou o pé que ficara para trás. A perna bem esticada. A tentativa bem conseguida. O sorriso de quem se apercebeu de ter cometido mais um grande feito. Apetece-me dizer-lhe que não queira ser adulto tão rapidamente, que nem sempre é bom sairmos do mundo de Peter Pan, que os fantasmas são mais aterradores quando se é crescido e os obstáculos são bem mais difíceis de ultrapassar que a altura de um degrau. Mas deixei-me ficar calada. Olhei-o. Tentei sorrir, como não há já algumas semanas. E eu sei que ele viu nessa minha tentativa não muito bem conseguida o orgulho que sinto dos seus grandes pequenos feitos.

Monday, September 28, 2009

Da gaveta de papéis


Sim...
"Gruas no cais descarregam mercadorias e eu amo-te.
Homens isolados caminham nas avenidas e eu amo-te.
Silêncios eléctricos faíscam dentro das máquinas e eu amo-te.
Destruição contra o caos, destruição contra o caos, e eu amo-te.
Reflexos de corpos desfiguram-se nas montras e eu amo-te.
Envelhecem anos no esquecimento dos armazéns e eu amo-te.
Toda a cidade se destina à noite e eu amo-te."

Sunday, September 27, 2009

...

Há alturas em que não aguento que as pessoas olhem para mim.

Saturday, September 26, 2009

Na Guerra Fria o agente é a Gripe A

Tento ensinar ao A Pequeno o melhor de mim. Tenho uma série de chavões em defesa e orgulho-me de ver o rapaz feliz quando lhe gabam a qualidade. Não contava com a Gripe A e menos ainda com a resposta das pessoas a ela. Hoje dei de caras com o corpo curvado de uma mulher que, minuciosamente, limpava a máquina de fotografias do metro com toalhetes; com uma jovem de manga de camisola na passagem do torniquete com que não queria ter contacto; e garanto-vos que nunca vira tanta mão a ser lavada numa casa de banho pública como esta manhã. E tudo isto no caminho para mais um dia de trabalho...
A cereja no topo do bolo do dia foi quando no Jardim o A Pequeno engraçou com um grupo de miúdos, na hora do lanche quis com eles partilhar as bolachas - gesto que as mães tanto apreciaram até... ao simples momento em que uma das crianças decidiu roubar a garrafa de água do A Pequeno e maldosamente meter o gargalo à boca. No segundo seguinte só tive tempo de ouvir a mãe afirmar a sua indignação com o comportamento da sua cria menor de seis anos, uma criança com ar de assustada cujo único crime teria sido ter sede. Em menos de nada haviam ido embora. Atrás dela todas as outras mães e crianças. E o A Pequeno ficou sozinho, comigo, estupefacta como uma não autorizada pinga de água consegue desconsertar toda uma crise social...

Thursday, September 24, 2009

Aiiiiii!

Não gosto de dor de garganta.

Tuesday, September 22, 2009

O mundo na verdade não vive sem heróis...

Há pouco respirei melhor durante pouco mais que dois minutos. A duração de um telefonema. Hoje é um dia importante. E quando antes descia a rua com o A Pequeno pela mão, olhou-me daqueles olhos bonitos, sorriu, beijou-me a mão e disse-me feliz encostadinho a ela: "és muito fofa!". Depois apercebeu-se que havíamos chegado ao mundo dos baloiços e dos escorregas, soltou-se, correu para a portinhola e, quando dei conta, andava já a defender uma menina polaca empurrada pelos rufias de quatro anos. O mundo na verdade não vive sem heróis...

Monday, September 21, 2009

Da força das pernas

A sensação de mal respirar é atrofiante. Sabemos que os pulmões funcionam, sentimos que o coração vai batendo e nada criamos de obstáculo junto às narinas. Mas a sensação de mal respirar é atrofiante. Em alguns momentos acentua-se e já em outros aparentemente melhora. Quando nos confrontamos com o outro há um click que não se sente e não se vê, mas que nos faz disparar em cada poro uma tentativa de máscara. Não é uma máscara de oxigénio, mas a suficiente para quem a olha acreditar ser credível e respeitar sem questionar. Mas a verdade é que no fim de tudo isto a sensação de mal respirar é atrofiante.

Friday, September 18, 2009

A linha do papel vegetal é boa

Quando colegas me chamam linha e papel vegetal pelos seis quilogramas que perdi em pouco tempo, o A Pequeno acarinhando-me diz que eu sou boa. Não sei se chore ou se ria. Beijei-o e ele sorriu pelos dois. Logo o dia ficou mais bonito.

Thursday, September 17, 2009

De cabeça torta para disfarçar

Não é nada bom procedimento, mesmo se por distracção, sentar em cima dos óculos.

Wednesday, September 16, 2009

Vivo numa camarata

Sempre pensei que como filha única a minha partilha de quarto fosse com o Amor da minha vida. Ainda não. Hoje vivo numa camarata de quatro. Felizmente sem ressonos. Nenhum até agora se queixou. Um chama-se Tobias. Estou certa disso. Os outros dois, segundo o A Pequeno, respondem a Popi e Papi. São todos iguais: o mesmo vermelho, a mesma ligeireza pela água, a mesma fome quando o A Pequeno lhes dá flocos coloridos e cheirosos. Mas pela proximidade dos nomes estou certa que, provavelmente, só estes dois serão gémeos. Há duas noites que os observo. A minha insónia participa no crescimento da conta da luz, mas permite-me controlar as movimentações nocturnas da camarata de forma discreta. Alguém me sabe dizer se estarão de insónia como eu ou se os peixes não dormem?

Monday, September 14, 2009

Zeta

Sete dias passaram.

Os meus dias não se desvelam luminosos, mas teimosamente nascem e me obrigam a sair da cama. Não exigem sorrisos; nem o poderiam. Não exigem forças, mas compensam-se pelo esforço do tentar. Não me pedem garra e aceitam a apatia de cada batida cardíaca.

As minhas noites não se desfazem mais em minutos felizes e horas de sonho, mas teimosamente continuo a sussurrar-me que talvez não faça mal sonhar. Só ainda não consigo sonhar. Nem sei se conseguirei... Sinto-me um Picasso escorrido.


Sete dias passaram com telefonemas e mensagens e e-mails e gente na minha porta e na minha sala e no meu quarto quando não me apetecia sair dele. O A Grande aparece em "busca de companhia" a cada refeição... e eu assim até como alguma coisa, fingindo não saber que é a mim quem procura neste emaranhado do meu olhar triste - sim, esses mesmos olhos que dizem que espelham a alma, os mesmos que me condenam sempre nas minhas emoções. O N liga de todo o lado e diz-me que descanse, talvez por acreditar que dormir repara todo o corpo - eu sou a prova provada que não, porque tudo em mim dói. Em sete dias já me perdi no caminho para casa, já fui à praia, já caí, já esfolei joelho e braços, já enegreci partes do meu corpo fisicamente machucadas e não me lembro de ter sorrido uma única vez. Mas em sete dias voltei às minhas salas, à poesia de Cristovão Falcão que me faz bem. E em sete dias o meu pai achou que salvei o mundo nos sete segundos da caminhada até ao lixo quando o chão era tão mais próximo, em sete dias a minha mãe mediu vezes sem conta - e como se eu não desse por isso - a proximidade dos meus ossos à pele e nos mesmos sete dias fiz o A Pequeno desembrulhar-se em sorrisos de felicidade com a simples ideia de que eu lhe havia enviado beijinhos.


Mas eu prometi-lhe. E eu nunca prometo nada a quem amo que não cumpra. Por muito que me custe. E desta vez quebra-se a cada segundo mais um pouco de mim. Mas eu tento. E avanço. Ou pelo menos tento. Na verdade, nem sei.
Passeio de manhã. Passeio à tarde. Passeio à noite. Entre cada passeio (sobre)vivo. Dizem que trabalho; eu aposto apenas que (sobre)vivo. A cada passo dado mantenho-me distante de mim. Ou penso que sim. Ou acredito que sim. Mesmo se me obrigando a acreditar como me obrigo a comer por um dia ter igualmente prometido em outras terras o mesmo a uma outra alguém que amo como a uma irmã. Passeio de manhã, à tarde e à noite e no vento que me bate na cara acredito estar um pouco mais perto do que quero estar perto e ter por perto, do que sinto, do que desejo, do que sou. Prometi-lhe. E eu nunca prometo nada a quem amo que não cumpra. Por muito que me custe. Pelo menos tento sempre. Por nós. Por te ter comigo sempre. Por viveres em mim em cada batida de um coração - o meu, o nosso, um só coração num corpo de duplicidades. E eu hei-de conseguir. Nós havemos de conseguir. Nós somos mais fortes. Nós somos fortes. Eu e tu. Verdadeiramente. E eu espero...

Tuesday, September 08, 2009

( )

Entre todos os espíritos que habitam a casa onde vivo, há vinte e quatro horas que existe mais um. Eu. Lamento dizer-vos que o vazio não escreve nem (se) partilha e por isso não sei quando nos encontraremos. Não levem a mal. Não é por mal. É só por tristeza. Fiquem bem.

Monday, September 07, 2009

Eu devo ter perdido este botão!?

Como diz o A, "a vida deveria de vir com a opção modo fácil".